Palavras...

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sexta-feira, 28 de outubro de 2016

A jornada de Lia nas CRÔNICAS DE AMOR E ÓDIO, de Mary E. Pearson.

Fugir para se encontrar...


Mentira, Traição, Escuridão...

  • Deception - ato de esconder a verdade, normalmente com o intuito de obter vantagens. Pode ser traduzido como mentira, engodo.
  • Betrayal - ato de cometer deslealdade com amigos ou com a pátria. Traição.
  • Darkness - insuficiência ou ausência de luz. Escuridão. 

  Estes três conceitos são os fios condutores da saga criada por Mary E. Pearson. Às vezes eles aparecem de modo bem explícito, porém, numa parte substancial da narrativa são apenas vultos que um leitor atento detecta como os indícios do que virá. 

  No Brasil o primeiro livro foi lançado pela Editora Darkside ano passado e virou febre. O segundo chega ao mercado dia 31 de outubro com status de objeto de desejo. O último volume ainda não tem previsão de lançamento por aqui.

De baixo pra cima: Darkside, 409 páginas; Henry Holt & Company 473 e 684 páginas

  À esta altura do campeonato acho que nem tem mais graça falar da premissa...  


  Contudo, devo observar que história da princesa que foge no dia de seu casamento, vai trabalhar como empregada em uma taverna, é perseguida pelo príncipe que a desposaria e por um assassino enviado por um reino rival, tem desdobramentos surpreendentes que revelam, tanto para as personagens quanto para os leitores, um mundo complexo, brutal e fundamentalmente regido pela tríade engodo-traição-escuridão.

  Ironicamente, é a negação e subsequente fuga de Lia que a colocam de frente à esta implacável realidade. Nossa heroína atravessa uma longa e árdua jornada de dor, perdas e decepções. Todavia, é este tortuoso caminho que a mune com força, coragem e amizades valiosas. Enquanto a Lia do primeiro livro é atraente, a que encerra a aventura é quase hipnótica.

Fuga

Descoberta
Enfrentamento

  Uma história bonita, bem executada e com personagens encantadoras. Daquelas que nos acompanham por muito tempo depois do ponto final do livro, fazem o leitor se solidarizar com suas dores, vibrar por suas conquistas e torcer para que elas tenham, de uma forma ou de outra, um final feliz.

  Para mim, THE KISS OF DECEPTION, THE HEART OF BETRAYAL e THE BEAUTY OF DARKNESS foram as grandes surpresas literária de 2016.


Um beijo e ótimas leituras.      

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Contos de Machado que recomendo (#7): TERPSÍCORE

"Às vezes, pensava no dinheiro, e recomendava ao marido que se contivesse, que salvasse alguma coisa para pôr na Caixa; ele dizia que sim, mas contava mal, e o dinheiro ia ardendo..."




  O conto TERPSÍCORE veio a público em 1886, no Suplemento Literário da GAZETA, mas só foi publicado em livro no ano de 1996, depois de ter sido resgatado - do meio de várias crônicas menores - pelo escritor Paraense Haroldo Maranhão

  Terpsícore é a musa grega da dança e da música, que, apesar de só aparecer no título da história, rege, implacavelmente, o comportamento dos protagonistas, Porfírio e Glória

TERPSÍCORE, musa da música e da dança - óleo sobre tela, Jean-Marc Nattier (1739)

  O conto começa com a esposa acordando e vendo o marido sentado na cama, o olhar perdido em preocupações. Na sequencia, somos informados da penúria em que o casal se encontra. Contas atrasadas, ameaça de despejo, o dinheiro que mal dá para a alimentação. 

  "Diabo! tanta despesa! Conta em toda a parte! é a venda! é a padaria! é o diabo que os carregue. Não posso mais. Gasto todo santo dia manejando a ferramenta, e o dinheiro nunca chega. Não posso, Glória, não posso mais..." 

  Todavia, os sentimentos de empatia e pena que, por ventura, se ensaiam no leitor, são rapidamente suprimidos, quando Porfírio relembra do comportamento (desde o momento em que decidiu cortejar Glória, até a festa de casamento)  que o conduziu para uma vida de dificuldades e privações.

"Antes, porém, de casar, logo depois de começar o namoro, Porfírio tratou de preencher uma lacuna da sua educação; tirou dez mil-réis mensais à féria do ofício, entrou para um curso de dança, onde aprendeu a valsa, a mazurca, a polca e a quadrilha francesa."  

"Que poupar despesas? Mas se num dia grande como esse não se gastava alguma coisa, quando é que se havia de gastar?"

"E assim se cumpriu tudo; foram bodas de estrondo, muitos carros, baile até da manhã. Nenhum convidado queria acabar de sair." 

  Endividado até o pescoço, sem economias guardadas e seis meses de aluguel atrasado, o rapaz resolve apostar em dois bilhetes de loteria, na esperança de ganhar e, a partir de então, levar uma vida mais previdente. O desfecho da história, entretanto, mostra como Machado botava pouca fé na capacidade das pessoas aprenderem com os próprios erros. 

  De uma forma muito bem humorada e irônica, ele deixa registrada a seguinte lição: quem nasceu para se comportar como cigarra, provavelmente nunca agirá como formiga.

-Ai, ai Machado... você é demais!!

Em 50 Contos de Machado de Assis, página 401.
   
Companhia das Letra, 487 páginas

Um beijo e ótimas leitura.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Coisas de Leitor: "Eu não preciso saber quem é Elena Ferrante!"

Penso que o fuzuê sobre a identidade da pessoa que escreveu A SÉRIE NAPOLITANA tem mais ligação com a necessidade de produzir notícias, do que com a (eventual) curiosidade de um leitor ou outro.




  Eu li A AMIGA GENIAL ano passado e lembro que achei massa a autora (ou autor) não revelar sua identidade e só dar entrevista via e-mail. Uma atitude até admirável em um mundo em que a regra é: exposição, exposição, exposição...  

  Li o livro, achei a história extremamente tocante, e quero muito ler os próximos volumes, porque preciso saber o que vai ser de Lila e Lenu. Criei empatia com as personagens, gostei da forma como a trama flui, me comovi com a realidade retratada e, portanto, pouco me importa a verdadeira identidade de Ferrante

  Quem ela é, ou deixa de ser, é tão irrelevante para mim, que chega ser engraçado ler algumas das afirmações que estão circulando por aí, dizendo que, agora que a identidade dela foi provavelmente descoberta, o nível de fascinação sentida pelos leitores tenderá a diminuir. 

- Faz-me rir!!!

  E desde que quando leitor - que é leitor mesmo, que gosta de se deparar com um bom texto, uma boa condução de trama, o leitor legítimo - precisa estar ciente dos dados no RG, CPF ou carteira de vacinação dos escritores que admira? 

  A mídia e os "formadores de opinião" estão muito mal acostumados à ideia de ditarem tendências e programarem o comportamento e a opinião das pessoas. Só que, comigo e com um monte de gente, isto não cola já faz tempo. 

  Se Elena Ferrante é Mané ou Manú, eu não quero nem saber! O que importa mesmo é a identidade do TEXTO escrito por ela. 

  O resto soa apenas como manipulação e desespero para completar pautas jornalísticas. 

Editora Globo, 331 páginas

- Deixa a criatura escrever em PAZ! 


Um beijo e ótimas leituras.